saia justa, lembranças, reflexões
Já existiu uma época em que ver Saia Justa me proporcionava mais prazer. Achava as discussões mais interessantes que “pseudo-intelectuais”. Apesar disto, ainda assisto e, em alguns momentos, sou levada à reflexão. Hoje, contrariando o que tenho sentido há um tempo com relação ao programa, fui levada à duas.
A primeira, com relação ao ocorrido em Santa Catarina e a mobilização para socorrer as vítimas da catástrofe.
Cada vez que acontece uma catástrofe - seja gerada por fatores da natureza ou atitudes de seres humanos - explorada pela mídia, penso nas que acontecem diariamente e não são super exploradas ou sequer divulgadas.
Certa vez, em uma saída com o Diogo, amigo querido, paramos em um bar na Evaristo da Veiga, Lapa (RJ), em frente a um lugar onde tocava samba em alto e bom som. Dentro deste espaço de show, pessoas que podiam pagar R$20 de entrada para se divertir ao som de bons músicos. Nós, por acaso, éramos do grupo que poderia pagar para estar lá, mas optamos por ouvir a música no boteco pé-de-chinelo em frente, tomando nossa cerveja em garrafa a R$2,50. O nosso samba naquele domingo foi na rua, junto dos que por alguma razão também estavam naquele pé-sujo.
Sambando, conheci um cara de aproximadamente 50 anos que morava numa favela próxima. Entre sambas e cervejas, ele nos contou coisas pesadas do local onde morava e vi naquela pessoa uma alegria que não se encontra em qualquer lugar. Não sei se isso se deu pelo excesso de bebida – meu e dele. Quando nos despedimos, senti tristeza, muita tristeza gerada pelo questionamento a respeito de como seria a vida daquele homem? Tão alegre, tão anestesiado, tão diferente... Chorei e mais nada.
É isso que fazemos, choramos e mais nada. Ajudamos e mais nada. E isso quando não ignoramos o mendigo que dorme na porta do prédio, às 4 da manhã, depois de uma carona de um amigo morador da Borges de Medeiros em seu super carro 4x4.
Márcia Tiburi levantou uma questão que já havia me atormentado a mente em algum momento.
Falou sobre se conviver bem com a desigualdade e se importar apenas com as conseqüências da mesma.
A partir desta reflexão, penso que ao mesmo tempo em que, no caso citado anteriormente, abri espaço para o diferente me contar um pouco de sua realidade tão estranha a mim, questiono-me se não o fiz apenas pelo fato de naquele momento sermos iguais: duas pessoas ouvindo o samba do lado de fora e pagando o mesmo preço pela cerveja, duas pessoas se divertindo da mesma forma.
Já com relação ao homem que tive que tomar cuidado para não pisar por estar dormindo exatamente no espaço da entrada do prédio, dei graças a Deus por este não acordar e tomar qualquer atitude violenta comigo, ou seja, pulei-o, ignorei-o e agradeci aos céus por ele não fazer nada que me agredisse.
Apenas isso.
Só me questiono sobre qual seria a sensação se algo ruim me acontecesse naquele momento. Ou pior, será que este homem que ignorei fez algum mal a alguém no dia ou semana seguinte?
Não sei. O que sei é que a mim nada foi feito e isso me bastou.
Assim como esses exemplos, muitos outros poderiam ser registrados. Sentada no sofá da espaçosa sala, com o notebook no colo, escrevo e reflito sobre as desigualdades que me abalam de vez em quando - quando através de um programa de TV paro para olhá-la de frente. Será que minhas adoradas ciências humanas me ajudarão a mudar alguma coisa aqui dentro – e lá fora – ou me servirão apenas como base para uma “pseudo-intelectualidade” e discussões em mesas de bar, onde, em alguns casos, só existe a necessidade de se falar mais alto e citar inúmeros teóricos clássicos?
Posso estar generalizando e me desculpem por isso. Há necessidade real de se pensar mais a respeito disso tudo.
A segunda questão que me levou à reflexão? Leila Diniz. Será que conseguirei escrever sobre essa figura mitológica antes de digerir a questão anterior?